Aplicação do princípio da proporcionalidade

ARTIGOS - ENTE PRIVADO

Equipe Blog Disciplinar

5/3/20256 min ler

Aplicação do princípio da proporcionalidade na gradação das penalidades administrativas

Em um Estado democrático de direito, a aplicação de sanções pela Administração Pública exige rigor técnico, respeito aos direitos fundamentais e aderência a princípios constitucionais. Dentre esses, o princípio da proporcionalidade se destaca como ferramenta essencial para garantir justiça, equilíbrio e racionalidade na escolha e aplicação das penalidades. No âmbito do Processo Administrativo Disciplinar, bem como no exercício do Direito Disciplinar e do Direito Sancionador, o uso criterioso da proporcionalidade é o que diferencia uma sanção legítima de um ato potencialmente arbitrário.

Este artigo pretende explorar, de forma aprofundada e prática, como a proporcionalidade deve ser utilizada na gradação das sanções aplicadas a servidores públicos e empresas. Serão discutidos fundamentos doutrinários, jurisprudência do STF, STJ, TCU e orientações técnicas da CGU, além de exemplos aplicáveis à realidade de comissões disciplinares e autoridades administrativas.

O que é o princípio da proporcionalidade e por que ele importa

A proporcionalidade é um princípio implícito e fundamental do Direito Administrativo brasileiro, com base no art. 5º, inciso LIV da Constituição Federal, que consagra o devido processo legal. Em essência, ela exige que as sanções sejam adequadas, necessárias e proporcionais à gravidade do ato ilícito praticado.

No campo do Direito Disciplinar, isso significa evitar punições desproporcionais, como a demissão de um servidor por faltas leves ou a advertência diante de uma fraude grave. Já no Direito Sancionador, sobretudo na responsabilização de empresas, a proporcionalidade orienta a definição da multa e a aplicação de sanções acessórias conforme o grau de dano causado e a conduta da empresa durante a apuração.

📚 Marcos Salles Teixeira, em sua obra Anotações sobre Processo Administrativo Disciplinar (2024), afirma:

“O princípio da proporcionalidade, no âmbito disciplinar, atua como um freio à sanha punitivista e um guia de racionalidade institucional na escolha da sanção.”

A proporcionalidade no Processo Administrativo Disciplinar

O Processo Administrativo Disciplinar (PAD), regulado pela Lei nº 8.112/1990, exige que a sanção aplicada esteja em consonância com a infração cometida, considerando fatores como:

  • A gravidade do fato;

  • Os danos causados ao serviço público;

  • O grau de culpa do servidor;

  • A existência de antecedentes funcionais;

  • A reincidência ou não da conduta;

  • O contexto e as motivações da infração.

A aplicação cega da letra da lei pode gerar injustiças. Por isso, a comissão processante deve motivar com clareza a sanção sugerida, conforme determina o art. 168 da Lei nº 8.112/1990.

📖 O TCU, no Acórdão 1.711/2017, alertou:

“É obrigatória a motivação específica da escolha da penalidade no PAD, considerando a proporcionalidade em relação aos fatos apurados.”

O princípio da proporcionalidade no Direito Sancionador empresarial

A Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção) introduziu no ordenamento jurídico brasileiro a responsabilização objetiva de pessoas jurídicas por atos contra a Administração Pública. Nesse regime, a dosimetria da sanção deve considerar os elementos descritos no art. 7º, como:

  • A gravidade da infração;

  • A vantagem auferida ou pretendida;

  • O grau de lesão aos cofres públicos;

  • A cooperação da empresa com a apuração;

  • A existência de mecanismos de compliance;

  • A reincidência.

📚 A CGU, em sua Nota Técnica nº 01/2019/CGU, estabelece que:

“A dosimetria das sanções deve observar critérios de proporcionalidade e razoabilidade, evitando sanções excessivamente severas ou desproporcionalmente brandas.”

Essa mesma lógica se aplica na aplicação das sanções previstas na Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações), especialmente nos arts. 156 a 160, que tratam das penalidades administrativas às empresas contratadas.

Jurisprudência dos tribunais superiores sobre proporcionalidade na aplicação de penalidades

A proporcionalidade é reiteradamente valorizada nos julgados do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Veja alguns exemplos relevantes:

  • STF, MS 25.063/DF: anulou demissão de servidor por considerar desproporcional à infração praticada;

  • STJ, MS 20.992/DF: reforçou que a penalidade administrativa deve guardar correlação com a conduta imputada;

  • STF, RE 657.718/MG (Repercussão Geral): estabeleceu que a dosimetria de sanções administrativas deve ser controlável judicialmente;

  • TCU, Acórdão 2.313/2019: determinou revisão de sanção aplicada a empresa licitante por ausência de fundamentação proporcional.

Esses entendimentos consolidam a compreensão de que a Administração Pública não tem liberdade absoluta para punir, devendo sempre justificar a sanção com base em critérios objetivos e proporcionais.

Erros mais comuns na aplicação desproporcional de penalidades

A seguir, elencamos algumas falhas frequentes na prática administrativa:

  • Aplicação de penalidade máxima sem considerar os antecedentes do servidor;

  • Falta de motivação na escolha da penalidade;

  • Desconsideração de atenuantes como arrependimento, cooperação ou baixa lesividade;

  • Imposição de sanções coletivas sem individualizar condutas;

  • Cópia automática de pareceres anteriores, sem análise do caso concreto.

📚 Como bem alerta Marcos Salles Teixeira:

“A falta de individualização da conduta e da pena transforma o processo em ritual vazio, com aparência de legalidade, mas sem justiça.”

Boas práticas para aplicação proporcional de penalidades

Para assegurar a aplicação justa e proporcional de penalidades administrativas, é fundamental adotar práticas que promovam a transparência, a uniformidade e a fundamentação adequada das decisões. Uma das ferramentas que auxiliam nesse processo é a Calculadora de Penalidade Administrativa disponibilizada pela Controladoria-Geral da União (CGU).

Utilização da Calculadora de Penalidade Administrativa da CGU

A CGU desenvolveu a Calculadora de Penalidade Administrativa com o objetivo de orientar e facilitar os cálculos referentes à dosimetria das penalidades aplicadas a servidores públicos federais, conforme a Lei nº 8.112/1990. Essa ferramenta considera diversos critérios estabelecidos pela legislação, como:

  • Natureza e gravidade da infração;

  • Danos causados ao serviço público;

  • Circunstâncias agravantes ou atenuantes;

  • Antecedentes funcionais dos envolvidos.

A calculadora está disponível no Portal de Corregedorias e pode ser acessada por qualquer pessoa interessada, incluindo membros de comissões disciplinares, gestores públicos e estudiosos do tema. O uso dessa ferramenta contribui para a padronização dos procedimentos e confere maior segurança jurídica aos processos de aplicação de sanções administrativas .

Além da calculadora, a CGU também disponibiliza o Guia Teórico e Prático da Dosimetria da Sanção Disciplinar, que oferece um passo a passo detalhado para a aplicação das penalidades, com base nos critérios estabelecidos pela Lei nº 8.112/1990. O guia aborda tópicos como a análise de fatores agravantes e atenuantes, e fornece sugestões práticas para justificar a aplicação das sanções .

Recomendações adicionais

Para aplicar sanções com proporcionalidade e evitar nulidades, recomenda-se:

  • Avaliar a conduta de forma individualizada;

  • Considerar o contexto dos fatos e os antecedentes;

  • Fundamentar expressamente a escolha da penalidade;

  • Registrar expressamente os fatores agravantes e atenuantes;

  • Evitar automatismos e comparações simplistas com outros processos.

O uso de ferramentas como a Calculadora de Penalidade Administrativa e a consulta ao Guia Teórico e Prático da Dosimetria da Sanção Disciplinar são práticas recomendadas que auxiliam na tomada de decisões mais justas e fundamentadas, promovendo a integridade e a eficiência na administração pública.

Considerações finais: a proporcionalidade como ferramenta de justiça administrativa

A proporcionalidade não é apenas um princípio técnico – é uma exigência ética e funcional da Administração Pública. O seu uso correto fortalece o Processo Administrativo Disciplinar, qualifica o Direito Disciplinar e assegura que o Direito Sancionador cumpra sua função sem se tornar um instrumento de perseguição.

Promover decisões mais justas, motivadas e equilibradas é o que se espera de gestores públicos e membros de comissões processantes. A proporcionalidade, nesse contexto, é uma bússola indispensável.

FAQ – Proporcionalidade na aplicação de penalidades administrativas

1. É obrigatório justificar a escolha da penalidade no PAD?
Sim. A motivação da sanção com base na proporcionalidade é exigência legal e jurisprudencial.

2. A empresa com compliance pode ter pena reduzida?
Sim. O art. 7º da Lei nº 12.846/2013 prevê a existência de programa de integridade como atenuante.

3. É possível revisar a sanção aplicada em PAD por desproporcionalidade?
Sim. A Justiça pode anular sanções desproporcionais, como já decidiu o STF em diversas ocasiões.

4. Quais critérios devo observar para definir a pena?
Grau de culpa, gravidade do fato, dano ao erário, reincidência, contexto e antecedentes.

5. A proporcionalidade se aplica apenas ao PAD?
Não. Também é essencial nos processos contra empresas, inclusive em licitações e contratos.

E você, já presenciou um caso em que a penalidade aplicada parecia desproporcional? Como sua instituição lidou com isso? Compartilhe sua experiência nos comentários e contribua para melhorar a cultura disciplinar no serviço público!

🔧Calculadora de Penalidade Administrativa – CGU
Ferramenta para auxiliar a dosimetria de sanções em PADs, com base em critérios objetivos:

👉 https://epad.cgu.gov.br/publico/calculadora/calc.html

📘 Guia Teórico e Prático da Dosimetria da Sanção Disciplinar – CGU
Manual completo com diretrizes para comissões e corregedorias:

👉 https://www.gov.br/corregedorias/pt-br/assuntos/painel-de-responsabilizacao/responsabilizacao-agentes-publicos/calculadora-de-tac-e-calculadora-de-penalidade-administrativa